domingo, 18 de maio de 2008

Entrevista com Guti Fraga (cont.)

Carla – E a sua adolescência, como foi?
Guti – Quando eu fui pro ginásio já havíamos mudado para Goiânia. Comecei a me relacionar com pessoas de outras classes sociais, e aí eu digo que sempre fui um cara pobre que teve muitas oportunidades, porque eu circulava em todas as áreas sociais. Um dos meus amigos, por exemplo, era filho de uma das dez mais elegantes da cidade, e às vezes ele me chamava para comer na casa dele. Como o meu nome é Gotschalk, ele dizia para a mãe dele que o meu pai era embaixador da Alemanha. Eles acreditavam e, é claro, achavam chiquérrimo eu estar lá. Ele fazia questão de me servir e fazia um prato de peão de obra. Lógico que eu matava tudo. Eu sempre tive uma relação bacana com os meus amigos, independente de classe social, de partido político, de qualquer coisa. Então essa questão da possibilidade de uma fusão de vida independente do financeiro ficou natural pra mim, e isso seria muito importante dali para frente.
Fui muito bem aceito pela turma, apesar da diferença de classe, e surgiu uma galera. Essa galera toda estava começando a curtir barzinho e eles sempre pagavam a minha conta. Só que eu enveredei para um lado totalmente diferente da vida deles, eu comecei a fazer teatro em 72. E comecei a fazer teatro com um grupo chamado Grupo Exercício, que foi importantíssimo na minha vida, mais do que tudo, só não mais do que esses meus amigos, que são meus amigos até hoje, alguns deles. Mas eu fazia teatro com esse cara e ninguém mais nem se amarrava em teatro.
Carla – Quem era esse cara?
Guti – Hugo Zorzetti, que era o diretor do grupo. E ele era muito intelectual, falava de revolução, falava de tudo. Já a minha política era muito humana, ela nunca foi intelectual, então nunca entendia intelectualmente as coisas, mas sabia que era um cara legal, e que era um cara que sabia dividir as coisas, e que sempre abria oportunidades pra quem quisesse ou precisasse. Zorzetti era quase um autodidata, sabia tudo de teatro. E eu era instintivo como ator, nunca fui um ator – mesmo trabalhando com ele – de fazer a linha intelectual, nunca tive saco, não tinha o hábito da leitura, acho que pela própria formação que eu tive, eu não cheguei a ter esse hábito nessa fase da minha vida. Mas lia sim, algumas coisas, porque se discutia algumas coisas em grupo, e como eu era quase um dos fundadores, na verdade, eu acho que comecei a ter opinião com esse grupo de teatro. Aprendi que a minha opinião valia, e isso foi muito marcante.

Um comentário:

Anônimo disse...

Estou gostando...
Celia