sábado, 30 de abril de 2011

God save the Princess



Não posso deixar de comentar o casamento real. O que seria dos escritores, afinal, sem os contos de fadas?

Houve quem achasse uma patetice assistir ao casamento, olhos grudados em cada detalhe como o buquê de murta, a linda renda francesa do vestido da noiva e o uniforme da Guarda Irlandesa usado pelo príncipe. Eu mesma me senti meio ridícula ao me emocionar vendo os dois trocarem comentários descontraídos no altar. Sou romântica, gente, fazer o quê?

Fato é que muito da história de vida de todas nós, mulheres ocidentais, está lá naquele DNA azul. Colonizadas que somos, aprendemos que casar de branco é lindo e assim é até hoje. Eu mesma tive um casamento de princesa, num lindo jardim em Itaipava decorado com margaridas. Tivesse tombado para o feminismo raivoso e dispensado toda aquela delícia de ritual, aposto que estaria hoje arrependida. Quando vejo as fotos do casório sinto, além de um nozinho na garganta, uma profunda felicidade por ter me permitido acreditar em cinderelas. Se contasse ainda que empunhei um buquê feito com todo carinho pela minha mãe, vocês veriam aonde quero chegar.

O amor é belo e persiste, meninos. Se em pleno século XXI um príncipe leva uma plebéia para o altar e comove bilhões de pessoas ao redor do mundo, conquistando audiência maior do que a do terremoto japonês, é porque o romantismo e a esperança ainda não acabaram. Até uma prece o casal escreveu junto, para ser lida na igreja. Digam o que quiserem, mas isso tudo é mesmo emocionante.
Acho até que os 70% dos britânicos que ainda apóiam a monarquia não estão nem aí para o regime monárquico. O que eles querem mesmo, no fundo, é a chance de poderem ver outros casamentos como esse.

“O último dos mendigos tem sempre um nadinha de supérfluo! Limitai a natureza às necessidades naturais e o homem se torna um animal”

Shakespeare

quarta-feira, 20 de abril de 2011

O coelho indica




Serrote é tudo de bom. Revista de ensaios, artes visuais, idéias e literatura do Instituto Moreira Salles, a publicação consegue, simplesmente, reunir o fino do fino da bossa. São textos que iluminam as sinapses e nos fazem ter certeza de que pensar ainda vale a pena. E então temos os excelentes ensaios de Beatriz Sarlo sobre o animal político da web e o de Louis Menand sobre o escritor Salinger, por exemplo. Lendo Menand, aliás, e relembrando o personagem de Holden, percebi o quanto grudei em O apanhador no campo de centeio. Vejo influências desse livro em meu trabalho até hoje, se vocês querem saber.

A revista 7, já editada pelo craque Paulo Roberto Pires, também traz fotos pungentes de Edu Marin sobre os estragos feitos pelas enchentes da região serrana fluminense. Nelas não aparecem vítimas, mas marcas de vidas interrompidas, vestígios de um cotidiano devastado pela natureza. De cair o queixo e doer o peito.

Querem uma sugestão? Aproveitem o feriadão para darem um pulo ao IMS. Vejam as ótimas exposições sobre o carnaval e a família imperial, depois tomem um café e comprem a Serrote. Programão.

Boa páscoa, crianças.

P.s. Para quem não sabe, a Serrote também é vendida em algumas livrarias, como a da Travessa. Mas no IMS sai mais barato.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Kitsch, kitsch




A capa nova do sofá, vinho berrante, não funcionou. Sei lá onde eu estava com a cabeça, gente. Deve ter sido o filme da Frida Kahlo que vi um dia antes de escolher o tecido. Fiquei louca com aquelas cores e queria aquilo tudo pra mim. O único problema é que agora preciso me mudar para o México. Hoje as duas, a capa e a parede laranja, disputam para ver quem grita mais alto pelas minhas costas, enquanto tento jantar: “Ela é louca! Loooouca!”. Pobrezinhas. Deve ser duro me terem como dona de casa.

A diversão ultimamente, entre meu marido e eu, é descobrir o que mudar no ambiente para salvar o sofá. Pintamos a parede de branco? Mudamos todos os outros móveis? Tiramos o tapete? O piso? É claro que a opção mais sensata é engolir o preju e mandar fazer outra capa. Mas aí não tem graça, meninos.

Em homenagem ao poder do vermelho, então, eis aí acima uma foto do Bruno Veiga, grande fotógrafo com quem tive o prazer de trabalhar na minha época de freela da Casa Cláudia. A foto faz parte da série Subúrbio, e lembra mesmo a casa do meu avô, em Jardim Primavera, reduto de alemães fãs de paredes revestidas com cacos de ardósia.

Quando freqüentava a casa do meu avô eu era muito nova, tinha dois ou três anos, mas lembro do ambiente até hoje como se estivesse vendo um filme da Frida Kahlo. Lembro da enorme porta de correr de couro com tachas douradas, da lareira, do salão de jogos com mesa de sinuca, da enfermaria (meu avô era médico), da mesa retangular na enorme varanda, do campinho, dos divertidos anões de jardim. Era uma casa engraçada e kitsch, como não poderia deixar de ser. Uma das raízes dessa palavra, aliás, é alemã – verkitschen – e, injustamente, é usada para definir objetos de valor estético distorcido. Mas o kitsch é muito mais do que isso.

Pensem na Carmem Miranda, no tango, nos filmes do Almodóvar, no pingüim de geladeira. Isso é o kitsch: nem cafona, nem brega e tampouco de mau gosto. Feito para sonhar, está acima de qualquer estereótipo. Ele homenageia o bom humor e sapateia pelo clássico, flerta com o lúdico ou revela seu lado cult através da arte pop, que o tornou mais conhecido mundo afora. Acima de tudo, é inocente: ao brincar com a arte e com o exagero, também busca a infância perdida. A origem do termo remete à idéia travessa da cópia, surgida no século 19, na Europa. Foi nessa época que turistas norte-americanos começaram a pedir aos pintores que fizessem apenas esboços (sketch) de quadros, que poderiam então ser vendidos mais baratos. Depois vieram as grandes magazines, os supermercados, os eletrodomésticos coloridos, e ficou mais fácil levar o kitsch pra casa.

Na casa do meu avô, o Opa, o kitsch tinha ainda outra simbologia: a despreocupação. Era uma casa desencanada como a Sandy não é, estava conectada em banda larga ao prazer e reservaria para as revistas de decoração o espaço nobre da lareira (acesa). Não era uma casa de capa de revista. Nem de miolo. E por isso mesmo era tão inesquecível.

P.s Terminei o livro do militar. Como a Dilma já levou a medalha de grã-Mestre da Defesa, eu me contentaria com uma estrelinha de honra ao mérito.