segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Blindando a paz II

Esclarecendo melhor a posição do meu biografado, o militar: segundo ele, a ajuda das FA, nesse momento, ainda é ilegal, apesar da autorização do presidente Lula e do aval do ministro da Defesa. É que, em caso de apoio das forças militares, o comando da operação deve ficar a cargo do Exército e não da Secretaria de Segurança do Estado. Trata-se de uma questão de hierarquia prevista em lei da Constituição Federal.

Não é bem uma guerra de egos. Caso um militar, em tiroteio com bandidos, atingisse um civil, por exemplo, ele não poderia alegar em juízo que cumpria ordens do governador ou do comandante da PM, já que o Exército só atende ordens do Ministério da Defesa e da Presidência. E ter a responsabilidade de matar inocentes é tudo o que o Exército, que ainda luta para se livrar da sombra da ditadura, não precisa.

E agora, José?

É claro que, nesse momento, isso parece ser o de menos. Mas realmente pode causar problemas futuros para as FA.
Eu, por enquanto, reles civil amedrontada, ainda não consigo pensar tão longe. Talvez o governador tenha metido os pés pelas mãos, mas confesso que estou gostando da acrobacia. Na torcida para que o contorcionismo de tal parceria não atrapalhe a vida de ninguém, eu sonho, como todos, com um Rio de Janeiro melhor. O que agora, com ou sem quebra de hierarquias, parece ser incrivelmente possível.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Para blindar a paz

Todos vocês seis já sabem que estou escrevendo o livro de um militar. Mais exatamente um capitão formado na Aman e bem inflexível quanto à participação do Exército na luta contra o tráfico: soldado não é policial e, portanto, não deve ser colocado em situações afins. O soldado não tem o mesmo treinamento que um cabo do Core e, pela Constituição, o uso de sua força em qualquer ação policial é ilegal.Para que essa "parceria" seja possível, seria preciso decretar estado de sítio.

Entendo os argumentos dele. Principalmente quando ele diz que o exército não tem que subir morro para matar traficantes. Mas confesso que ontem, vendo os tanques da Marinha amassarem barricadas como se fossem baratas, recapitulei. Há colaborações e colaborações. Os fuzileiros navais não entraram em confronto direto com os bandidos e foram cruciais na operação de ontem, no Alemão. Tanto que, à noite, quem recapitulou foi o próprio Exército, oferecendo uma ajuda negada há três anos.

Já vi que terei longas conversas com o meu biografado. Mas tudo em nome da paz. Ontem, vendo os noticiários, dava até nó na garganta perceber o apoio da população. Pela primeira vez, desde que me conheço por gente, também tenho esperanças no Rio de Janeiro. E suspeito que isso seja tão importante quanto o empréstimo de alguns urutus.

P.S. Terminei o freela urgente. Era o texto de um projeto inédito de transformação do universo artístico de Adriana Varejão em videoarte. Quando essa exposição despontar no jornal, anotem datas e horários. Sem dúvida vai valer a pena.

domingo, 14 de novembro de 2010

SOS


Azulejaria "de tapete" em carne viva, 1999, óleo sobre tela e poliuretano em suporte de alumínio e madeira

Acontece de vez em quando. Devo ter um certo ímã para emergências. Além de escritora freelancer, também poderia me intitular escritora SOS. Apareço correndo, desarvorada, um tanto sem fôlego, para assumir textos cabeludos que devem ser entregues anteontem de manhã cedo. Geralmente não consigo dizer não. Tenho exercitado esse aprendizado, mas ainda não cheguei ao Nirvana.

Daí pego o freela, fico preocupada, depois levemente desesperada, em seguida quase perco o sono, e mais um pouco caio dentro e gosto. Vai entender. Mas fato é que graças a esse trabalho urgente estou mergulhada no desconcertante universo da artista plástica Adriana Varejão, onde a carne é feliz e o barroco é “puro dentro”.

Quanto terminar o trabalho conto tudo. O blog, enquanto isso, tem que esperar. Ninguém disse que a vida é fácil, crianças.

Bom feriado pra vocês.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

A princesa limpinha

Queria uma faxineira de verdade, que entendesse os seus conceitos de limpeza. Conceitos de limpeza podem ser muito subjetivos. Queria que as formigas simplesmente desaparecessem do planeta. Queria lençóis cheirosos sempre, toalhas sequinhas, chão brilhando. Serviço de hotel cinco estrelas com charme de pousada, funcionários silenciosos e discretos, vida que funciona sem que você nem se dê conta.

Queria uma vida de princesa, com uma camareira para escolher seus vestidos e lavar seus cabelos. Melhor, queria não ter cabelos. Devia ser de uma liberdade orgástica não ter mais cabelos que ficam oleosos num piscar de olhos ainda irritados com o xampu. Viveria com chapéus ornamentados para os dias de festa e chapéus mais discretos e leves para o ordinário cotidiano. Se bem que se fosse uma princesa o ordinário não existiria. Seria uma sucessão de bandejas de prata com frutas frescas, água gelada com folhas de hortelã, biscoitinhos de canela no meio da tarde, café com broinhas de fubá a qualquer momento. Se bem que assim seria uma princesa gorda, e princesas gordas não existem.

Viveria saltitando entre as dezenas de cômodos do seu palácio, impressionando-se ao ver os rodapés sempre tão limpinhos, sem um átomo sequer de poeira. Então voltaria para o seu arejado quarto e fitaria suas almofadas a prova de ácaros. Sentiria uma coceira leve no nariz e teria vontade de espirrar, mas não o faria porque, afinal, os ácaros não estavam lá. O que lhe traria uma leve saudade de espirrar, breve nostalgia do movimento, espasmo que sacode o corpo inteiro, expelindo micróbios e invejas.

Nesse momento olharia para o seu vestido engomado e perceberia um leve desconforto no abdômen. Vontade de liberdade com dificuldade em traduzi-la. Correria para a varanda. O dia estaria lindo, sol e céu azul lavado, como nas aquarelas que aprendia a fazer nas manhãs de terças e quintas, mas por algum motivo que não o sabia, entristecia.

Sentia enrijecerem seus pés massageados há algumas horas. Um gelado cobria sua cabeça perfumada. Fechou os olhos. Sentia-se asséptica. Incapaz de produzir bactérias, fungos, germes patogênicos e outros bichos similares e invisíveis a olho nu. Abriu os olhos. Viu muitas flores, rosas e antúrios entre elas, mas não sentia-lhes os aromas. Olhou mais uma vez. Pessoas choravam ao seu redor. Velas acesas. Tentou esticar os braços. Não respondiam. Tentou gritar. Garganta muda. Então só lhe restou sentir a textura suave do cetim bege sobre o qual estava deitada. Estava limpo e cheirava a amaciante de lavanda. Finalmente encontrara a higiene perfeita.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Lançamento

É amanhã o lançamento da antologia de prosa do jornal Plástico Bolha, pela editora Oito e meio. Na livraria Ponte de Tábuas, no Jardim Botânico, às 19h30m. Eu vou, meninos.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

A caminho



Eu quase desisti. Trânsito comprido, uma ventania até então inédita aos meus olhos semi cariocas, promessa de pancadas de chuva ameaçando a idéia de subir a serra. Enquanto as bandeiras de Serra e Dilma tremulavam forte na Lagoa, parei num posto de gasolina. Entrei na lojinha, comprei chicletes, andei pra lá e pra cá, vou não vou. Decidi. Sim, eu iria para Petrópolis votar. Ninguém mandou não mudar de seção eleitoral. Precisava cumprir o meu dever cívico.

Peguei a estrada orgulhosa de mim mesma. Perto do aeroporto internacional, as gaivotas planavam mais austeras do que nunca. O motorista à minha frente, janela aberta, deixava o forte vento brincar com a sua mão esquerda. Liberdade é isso. É seguir seu próprio caminho, seja ele qual for, desde que seja democrático.