sábado, 28 de março de 2009

Entre deuses e mortais

O Mahabharata. O Mahabharata de William Buck é confuso, com overdose de personagens excêntricos e esquisitices, passagens longas demais, números improváveis. E lindo.
Que jeito melhor de explicar o mundo afinal que não pelo riso de canto de boca, aquele que sabe que o que se fala sobre esse assunto não se escreve e o que se escreve, se releva? Ou enleva?
É uma das descrições do mundo e dos homens mais criativas e iluminadas que já vi. Bom, sem dúvida é mais elevada e colorida do que um mito persa que conheço, que conta que a Terra foi criada para servir de esgoto para o Paraíso, depois que todo mundo resolveu comer os frutos proibidos. Ah, os frutos proibidos.
No Mahabharata todas as criaturas vivas são múltiplas, misturadas, imprevisíveis. Os deuses se misturam com os mortais, lhes emprestam poderes, conversam, banqueteiam e jogam dados. O inferno fede e o céu é uma festa, para a qual se vai de carruagem, com alguma sorte, e no qual cada dia representa, na Terra, um ano. Era por isso que as meditações demoravam tanto, gente. Era só passar quinze dias com os deuses para se ausentar da Terra por mais de uma década!
No meio disso tudo, está a idéia de que as divindades, incluindo o Brahma, criador do Universo, não são tão diferentes dos homens assim. E por isso vale dizer, sempre, entre hinduístas, que Deus está dentro de cada um. Namastê, aliás, quer dizer o seguinte: “O deus que está em mim e a verdade que eu sou reconhece e saúda o deus que está em você e a verdade que você é”. Bonito, não?
Arjuna, o grande guerreiro, por exemplo: é filho do deus Indra com uma mulher normal. A mistura é interessante: quando uma mulher “se deita” com um deus, o filho nasce no dia seguinte. Convenhamos, não é muito mais prático?
Ao contar a guerra dos Kurus contra os Panchalas e Pandavas, o épico indiano explica a vida tocando em alguns pontos nevrálgicos da humanidade. A morte, por exemplo. Ao final da batalha, Duryodhana, dos Kurus, está derrotado. Coberto de poeira e em agonia, ele recebe a visita de Aswatthaman, um de seus aliados. Inconformado, Aswatthaman pergunta onde estão os outros soldados, os irmãos de Duryodhana, ou as centenas de reis que estavam no seu exército.
Limpando o sangue de seus olhos, Duryodhana diz: “Eu vou contar a você a história da morte, e como nenhum deus tem controle sobre ela”.

Continua
(não percam)

Um comentário:

Valéria Martins disse...

Oi, Carla! Bom saber de você, vou linkar seu blog no meu para visitá-la sempre.
Como vão os trabalhos? No momento, estou como tu: escritora free lancer ao mesmo tempo em que atiro para outros lados.
Vamos manter contato. Beijão,