sexta-feira, 13 de março de 2009

É rapidinho!

Um dos males que um escritor freelancer costuma sofrer, além de gastrite e insônia, é o vício contumaz por emails. Checar email é quase tão importante quanto respirar ou tomar café depois de mais uma madrugada de olhos abertos e cabeça cheia. Principalmente quando se está esperando mais uma resposta a um orçamento e uma avaliação de projeto editorial.
Como ainda não tenho iphone nem blackberry (lembrem-se, eu ainda sou uma escritora mas não consigo – raios! - criar nenhum Harry Potter nem me inspirar no Paulo Coelho), tenho sempre comigo algum cartãozinho de cibercafé. Ontem usei o da livraria Letras & Expressões, no Leblon. Na primeira tentativa não funcionou, na segunda também não. O responsável técnico foi chamado. Como os outros dois computadores estavam ocupados, levantei e fiquei esperando resolverem o problema.
E aí, aí, crianças, entra em cena uma mulher apressada, muito apressada. Eu poderia até ter me solidarizado com a sua pressa, que também era minha, mas não vi nela nada que me fizesse acreditar que ela realmente precisava tirar o pai da forca. Dá licença, cambada, mas eu conheço os sinais de estresse, e nela não havia nenhum fio fora do lugar, nenhuma ruga alterada, nenhum amarrotado na sua roupa e principalmente nenhuma nuvem negra acima da cabeça bem penteada, ah, vocês me entenderam. Ela só estava com pressa, porque as pessoas têm isso, pressa, muita pressa.
“Você se incomoda se eu passar na sua frente? É rapidinho, eu só vou checar o hotmail”, ela me disse, enquanto eu, resignada, esperava o técnico chegar. “Esse computador não está funcionando”, limitei-me a responder, achando que seria o suficiente para que ela entendesse que ó, deus, que lástima, não é que o mundo não gira em torno do seu umbigo?
Não foi, é claro. Vendo que comigo a sua ladainha não colava, passou a examinar criticamente o que a outra usuária andava fazendo em uma das máquinas ativas. E, horror dos horrores, a moça estava no orkut! Mas ela, a mulher com pressa, precisava usar o hotmail! E ela é muito mais importante do que aquela mulher que parece mais uma empregada checando a vida do José Silva!
“Você ainda vai demorar aí?”, ela perguntou para a frequentadora do orkut. Humilde, a moça respondeu que ainda tinha dez minutos no cartão. Quanta petulância, não?
Ela, a mulher com pressa, poderia, a essa altura, ter percebido que devia se mandar dali, respirar fundo três vezes, se ajoelhar na calçada e fazer algum tipo de penitência como cortar um dos seus cartões de crédito (ou de cibercafé). Mas pensar dói, como dizia um antigo professor meu, e ela continuou se recusando a entrar na fila de apenas uma pessoa (eu). Que coisa de pobre, isso de fila. Brasileiro adora uma fila, gente!
Quando o que seria o meu computador voltou a funcionar, ela botou a mão na cadeira e me pediu, como se a vergonha e o bom senso fossem ações falidas pela crise mundial. “Posso usar? É rapidinho! Eu só vou checar o hotmail!”.
“Engraçado, que coincidência, eu também vou só checar email, e rapidinho!”, eu disse.
E vocês acham que ter coragem de falar isso foi o suficiente? Bobinhos. O narcisismo é ilimitado, crianças, aprendam isso logo antes que fique mais difícil.
“Mas é que eu tenho hora marcada, daqui a 15 minutos!”, ela respondeu.
Eu continuei tentando. Falei que eu também estava com pressa e que ali deveria ter uma certa ordem, e a ordem era a de quem chega primeiro, usa o computador primeiro. E rapidinho!
“Mas você tem hora marcada?”
Desisti. Deixei a poderosa checar o hotmail dela e sair com jeito de apressada. Deve ter ido tomar um café na esquina antes da tal hora marcada.

Também é rapidinho que se entra numa rua na contramão, mas isso não faz com que o outro não seja prejudicado, aquele otário que tenta dirigir na mão certa.
Também é rapidinho que se atravessa o sinal vermelho e rapidinho os idosos, esses lerdos, são atropelados.
E tenho certeza de que também deve ser bem rapidinho desviar, por computador ou canetada, milhões de reais dos cofres públicos.
E de rapidinho em rapidinho, a vida fica mais lenta e difícil para muita gente.
Principalmente para aquelas que parecem não ter direito de usar o orkut.

Um comentário:

Anônimo disse...

Um pouco atrevida a moça, não?
Beijos
celia