quinta-feira, 23 de junho de 2011

Scott Lindenbaum e McLuhan: seremos elétricos


Em tempos de mudernidade, escreverei mais ou menos como se tuíta, em pequenos tópicos (com mais de 150 caracteres, é claro, porque não sou tão moderna assim) e aspas para o cara da vez, Scott Lindenbaum. Falemos sobre o Oi Cabeça, que repensa os rumos da narrativa diante da tecnologia e recebeu ontem o cofundador da revista americana Electric Literature. É uma revista literária como outras, que publica trimestralmente cinco contos. A diferença é que ela joga nas 11 (ou 5, por enquanto): formato impresso, ebook, iPad, iPhone e PDF por e-mail. Já é um sucesso e incomoda editoras tradicionais. Criada em 2009, já publicou autores de peso como Michael Cunningham, Rick Moody e Lydia Davis.

O evento, realizado no Oi Futuro, teve tanta audiência que jogaram almofadas no chão para o povo dos sem senha, do qual eu fazia parte. Saí de lá três horas depois com uma dor lancinante no quadril e nos joelhos iogues, mas feliz, antenada e esperançosa. O livro pode até acabar, mas os escritores sobreviverão como as baratas do apocalipse.

Em seguida, o que consegui anotar no escuro enquanto perdia a sensibilidade das pernas:

- Tudo o que Scott Lindenbaum tinha em mãos, depois da faculdade e antes de criar a revista, que já amealhou mais público do que muitas editoras tradicionais americanas (já são 150 mil seguidores só no twitter), era um “otimismo insano”. Anotem esse ingrediente.

- “Percepção é realidade”, e tudo o que eles queriam, a princípio, era tornar a literatura interessante e divertida para outros públicos, e se divertirem enquanto faziam isso. A julgar pela animação do rapaz, piadista como todo bom americano e muito interessado em experimentar a nossa caipirinha, conseguiram.

- Talvez McLuhan não estivesse tão certo assim ao dizer que as novas tecnologias trazem, junto com a comodidade, a capacidade de minar nossos sentidos. Com o projeto BROADCASTr, Scott conseguiu recuperar a força da história oral, “linkando” os lugares com suas vozes. “Toda voz precisa de um espaço”, e, com a ajuda da tecnologia do GPS e do andróide Broadcast Receiver, 500 histórias podem ser ouvidas pelo celular em Manhattan, cada uma delas relacionada ao local onde se encontra o leitor/ouvinte. Então pode-se caminhar pelo quarteirão do WTC e, tocando no mapa através da tela do telefone, ouvir os relatos de um bombeiro que trabalhou nos resgates do atentado terrorista. Wow: isso é como dar um ouvido para um olho, desentortando a frase do guru canadense, interessado em explicar que o órgão dominante dos sentidos e da orientação social nas sociedades pré-alfabeto era o ouvido, e que o alfabeto fonético forçou o mundo mágico do ouvido a se deslocar para o mundo neutro do olho: “Foi dado ao homem um olho para o ouvido”. Agora parece que estamos quites.

- As livrarias tradicionais estão de fato com os dias contados. O livro vai se tornar, em breve, um fetiche como o LP. Por enquanto, as vampire novels sustentam todos os outros livros que não vendem suas tiragens. Engraçado. No mercado editorial são os humanos que sugam o sangue dos vampiros.

- A Eletric Literature trouxe, de certa forma, a experiência visual para a literatura. Mas a imaginação continua sendo mais importante, garante o editor. Lembrem de fechar os olhos.

- Estão a salvo os editores, desde que eles trabalhem a intuição e o bom gosto editorial. E de novo me lembro de McLuhan escrevendo que, quando todos os recursos e energias disponíveis já foram usados em um organismo ou estrutura, há uma certa reversão do modelo, uma volta ao “olhar para dentro”. Sobreviverão aqueles que, como Andy Warhol, “editou pessoas” ao se unir a seres com a mesma “gravidade específica” como Tom Waits e Jim Jarmush, quando ainda não eram famosos. “Densidade de idéias criam cenas que, com o tempo, criam movimentos”, disse o editor elétrico. Foi aplaudido com faíscas.

Devo dizer ainda, apenas em homenagem à minha autoestima, que sempre pensei no livro como um conjunto de símbolos mais ou menos integrados, diferente do trabalho autoral. É bom pensar a escrita como a metáfora acústica e visual que estabeleceu as dinâmicas da civilização ocidental, mas ela é muito mais do que isso. O livro é uma extensão do olho.

"In the eletric age we wear all mankind as our skin."

Marshall McLuhan

2 comentários:

heloisa buarque de hollanda disse...

Geniais esse comentários sobre a palestra do Scott! Vou guarda-los nos meus arquivos. O melhor resumo que se poderia ter das idéias elétricas do palestrante! Parabéns

Anônimo disse...

Baba baby baba, não é para qualquer um receber elogio de Heloísa Buarque de Hollanda .... Eu babo também.Uschi.