segunda-feira, 21 de julho de 2008

Pássaro-palavra

É que nunca me entrevistam, porque se me entrevistassem de vez em quando e me perguntassem qual é o meu escritor ou escritora preferida, diria, como num mantra: Hilda Hilst Hilda Hilst Hilda Hilst. Não sabe quem é? Informe-se, diria ela.
Da prosa já li a obra completa, e é arrebatadora. Alguns textos são como socos no estômago, mas você sempre sobrevive. Baqueado, afônico e meio vesgo, mas melhor do que antes. Nunca havia ficado tão siderada como fiquei com suas funduras, seus adentros, seus embaçados. Agora começo a ler as poesias e elas têm a mesma luz da ficção, mas com algum colorido a mais. E como só a poesia salva, diria a bruxa da Casa do Sol, aí vai um alento para esses tempos tão difíceis para nós, escritores de aluguel e outros mortais:

Amada vida:
Que essa garra de ferro
Imensa
Que apunhala a palavra
Se afaste
Da boca dos poetas.
PÁSSARO-PALAVRA
LIVRE
VOLÚPIA DE SER ASA
NA MINHA BOCA.

(...)

Que essa garra de ferro
Se desfaça
Diante da luz intensa
Da palavra.

PALAVRA-LIVRE
Volúpia de ser pássaro

Amada vertiginosa.

Asa.

“Poemas aos homens do nosso tempo”, parte X, in Júbilo, memória, noviciado da paixão. 2 ed. São Paulo, Globo, 2001.

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