quinta-feira, 15 de setembro de 2011

A Índia, lá e aqui



Acabo de ler A mão morta, de Paul Theroux, lançado aqui pela Alfaguara. Como A suíte Elefanta, que li antes desse, os livros dele me seguram não pelas tramas, um tanto previsíveis, mas pela Índia decrépita que ele é capaz de descrever. A cada livro que passa ela fica pior: mais inchada, miserável, imunda e barulhenta. Mais hipócrita, também, com indianos materialistas e gurus contraditórios. Querem mais? Tomem então crimes hediondos nunca investigados, trabalho escravo infantil e pedaços de corpos boiando no Ganges, o rio mais poluído do mundo e, no entanto, sagrado. Os indianos vão até Varanasi para banharem-se nele e ficarem limpos espiritualmente. O que acontece é que, se ninguém morre depois de se molhar naquela água capaz de contaminar elefantes, provavelmente não morrerá mesmo, nunca mais. É a chancela da poluição química abrindo caminhos mais elevados.

A minha Índia, no entanto, por mais que eu leia esses livros que parecem feitos para varrer pra sempre os estrangeiros de Calcutá, continua mágica. Penso nos ashrams sérios, respiro fundo enquanto recito um mantra sagrado em algum lugar do meu inconsciente e vejo as cores dos sáris, amarelo, roxo, vermelho, e as pinturas de henna das dançarinas, os incensos, e até as samosas e o dhal que eu, é claro, jamais teria coragem de experimentar.
Lembro o que dizem outros livros, como Planeta India, de Mira Kamdar, e o ar vai ficando mais respirável.
O que Paul Theroux não conta, para não estragar suas investidas na ficção, é que a India ultrapassou os EUA e se tornou o segundo destino preferido para investimento direto depois da China, por exemplo, e que, aliás, a essa altura, já deve ter duas vezes mais profissionais com curso superior do que a China. Que abriga a maior população jovem do mundo e que se transforma, rápido, numa potência global que afetará profundamente nosso futuro, provavelmente produzindo energia renovável.

Essa, apesar do Theroux, ainda é a minha Índia. Ao menos enquanto eu não puser meus pés lá.

Abaixo, de brinde, um trechinho do livro de Mira Kamdar pra vocês. O do Theroux não dá para colocar aqui. Assustaria os meus seis leitores.

“Muita gente acha que já é hora de a Índia, um das maiores civilizações do mundo, se recuperar dos terríveis danos da colonização e reivindicar seu lugar de direito entre as grandes nações do mundo. (...) A pobreza do país é sentida por muitos indianos como a suprema humilhação, tirando dela seu status legítimo de potência global, um lembrete permanente da injustiça colonial que pilhou a Índia durante o domínio britânico. Os indianos tem profunda convicção de que, num campo equitativo, eles poderão bater o Ocidente em seu próprio jogo.”

2 comentários:

Valéria Martins disse...

Querida Carla, eu tampouco fui à Índia. Mas meu amigo e colega de faculdade Luis Nachbin, aquele que faz o programa Passagem Para... no Futura, já foi umas 10 vezes. Ele vê a Índia com olhos mágicos como o seu... Por causa dele, eu tenho muita vontadade de ir.

Beijos!

Carla Mühlhaus disse...

Oi, Valéria,
O Nachbin foi meu professor na PUC! E também gosto muito dos programas dele. O sonho de ir à Índia continua de pé.

Bjs